Era uma vez uma tentativa de golpe
Os depoimentos revelaram aquilo que já vinha sendo denunciado com insistência por setores democráticos
Durante a semana, o Brasil assistiu a uma série de depoimentos sobre a mais grave ofensiva contra a ordem democrática desde a redemocratização do país. Do Supremo Tribunal Federal para o mundo, em transmissão ao vivo, generais da reserva, ex-ministros, auxiliares e o próprio ex-presidente da República foram chamados a responder, não apenas a perguntas, mas à História. E o que se viu foi a exposição inequívoca de uma tentativa de golpe de Estado que, embora tenha sido um fiasco, não foi menos real ou menos perigosa.
A trama, arquitetada nos bastidores do poder e nas sombras do fanatismo ideológico, não surgiu por acaso. Ela é herdeira de um país onde setores das Forças Armadas, partidos conservadores e grupos empresariais, em diferentes momentos da história, conspiraram contra a soberania popular sempre que o resultado das urnas contrariou seus interesses. A diferença, agora, é que a tentativa golpista foi escancarada e transmitida em tempo real pelas redes sociais, alimentada por discursos de ódio e legitimada por um político derrotado que jamais aceitou a alternância de poder, uma das regras básicas da democracia.
Os depoimentos revelaram aquilo que já vinha sendo denunciado com insistência por setores democráticos. Bolsonaro não apenas cogitou, mas trabalhou ativamente com seus aliados para subverter o resultado eleitoral. Minutas golpistas foram elaboradas, encontros com militares foram realizados, estratégias para prender ministros do Supremo e invalidar as eleições foram discutidas com naturalidade criminosa, como quem planeja uma festa de aniversário.
E diante da Justiça, o que vimos? Um ex-presidente acuado, evasivo, incapaz de sustentar o discurso autoritário que tanto inflamou seus seguidores. Chegou a ponto de se referir a seus próprios apoiadores como “malucos”, numa tentativa vergonhosa de se desvincular da multidão que ele mesmo convocou às portas dos quartéis. A coragem que exibia nos palanques deu lugar à covardia ensaiada de quem, agora, teme as consequências jurídicas de seus atos criminosos e irresponsáveis.
Diante das revelações e das contradições que surgiram nos depoimentos, esperamos que o Supremo Tribunal Federal, em consonância com o Ministério Público e os demais órgãos de investigação, acelere o andamento do processo. A responsabilização penal de todos os envolvidos não é apenas uma exigência legal, mas uma necessidade histórica. O Brasil precisa demonstrar, com firmeza, que atentados contra a democracia não serão tolerados, seja no palanque, no quartel ou nos gabinetes do poder. Só assim será possível restabelecer a confiança nas instituições e garantir que os fantasmas autoritários do ado não voltem a ameaçar nosso presente e nosso futuro.
Mas é preciso ter clareza! Não se trata de vingança ou de revanchismo. Trata-se de proteger a democracia. Um país que não responsabiliza seus golpistas incentiva novas tentativas. O povo brasileiro não pode mais aceitar que seus representantes brinquem com a Constituição, rasguem o Estado de Direito e coloquem em risco a estabilidade institucional em nome de projetos autoritários e personalistas.
A tentativa de golpe não foi um delírio. Ao afirmar, durante o julgamento, que os episódios em que questionou o sistema eleitoral e atacou magistrados foram fruto de “um desabafo, uma retórica que eu usei”, Bolsonaro tentou convencer a Suprema Corte de que tudo não ava de um jogo político — e não de ações de subversão institucional. Mas houve planejamento, articulação e intenções claras de ruptura. E dessa verdade, o “Mito” não conseguirá escapar. A retórica do golpe não foi apenas discurso: foi projeto de poder, de ódio e de dominação — e precisa ser enterrado, para nunca mais assombrar nossa democracia. Sem anistia para golpistas. Isto é indiscutível. Isto é inegociável.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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