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Luis Mauro Filho

Luis Mauro Filho é jornalista, formado em Estudos de Mídia pela Universidade do Wisconsin, e é editor do Brasil 247.

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Apoiado por EUA e França, governo sírio busca legitimidade, mas raiz jihadista e tensão com Israel desafiam estabilidade

Após queda de Assad, presidente interino al-Sharaa assume poder com promessas de paz, enquanto milícias islamistas ameaçam reconciliação regional

Ministro das Relações Exteriores da Síria, Asaad Hassan al-Shibani 30/12/2024 (Foto: REUTERS/Khalil Ashawi)

A queda de Bashar al-Assad no fim de 2024 surpreendeu o mundo e alterou o equilíbrio de forças no Oriente Médio.

No lugar do governo que controlava a Síria há décadas, emergiu uma liderança inesperada: Ahmed al-Sharaa, ex-comandante jihadista e figura central da insurgência armada contra Assad.

A chegada de Sharaa ao poder deu início a uma rápida e complexa reconfiguração política, não só dentro do território sírio, mas em toda a região.

Sharaa, também conhecido como Abu Mohammad al-Golani, já havia liderado a Frente al-Nusra, braço sírio da Al-Qaeda, e depois comandado o Hayat Tahrir al-Sham (HTS), grupo que ou a tentar se dissociar da rede global jihadista.

A coalizão que liderava, com apoio de potências sunitas como Turquia, Catar e Arábia Saudita, aproveitou o enfraquecimento das forças de Assad — cujos aliados, Rússia e Irã, haviam se retraído — para avançar sobre Damasco e tomar o poder.

Com a deposição de Assad, Sharaa se proclamou presidente interino, dissolveu o parlamento e anunciou a intenção de organizar eleições. Ao mesmo tempo, prometeu governar de forma mais inclusiva, distanciando-se da imagem radical que o acompanha. Mas os desafios são imensos: além de reunir um país devastado por 14 anos de guerra, ele precisa pacificar milícias armadas, istrar rivalidades sectárias e conquistar a confiança internacional.

O Ocidente respondeu com pragmatismo. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, não hesitou em mudar o tom. Em poucos meses, sua istração suspendeu parte das sanções, elogiou a nova liderança síria e deu sinais de que estava disposta a reabrir relações com Damasco.

Trump chegou a encontrar-se pessoalmente com Sharaa, em Riad, e afirmou que o novo presidente tinha “uma chance real de manter a Síria unida”.

A França também adotou uma postura semelhante. Emmanuel Macron recebeu Sharaa no Palácio do Eliseu, em Paris, e defendeu que as sanções europeias fossem retiradas. A justificativa era simples: com a queda de Assad, punir economicamente a Síria deixava de fazer sentido. Em troca, Macron exigiu o compromisso com reformas políticas e proteção às minorias.

Esses gestos logo se traduziram em ações concretas. Em maio de 2025, os Estados Unidos hastearam sua bandeira novamente em Damasco, um gesto simbólico realizado pelo enviado especial Thomas Barrack.

Ainda que a embaixada não tenha sido oficialmente reaberta, a movimentação representa uma guinada na relação bilateral. Barrack, inclusive, afirmou acreditar que um acordo de paz com Israel era possível e desejável.

A reconstrução econômica da Síria se tornou prioridade imediata. Estima-se que o país precise de ao menos US$ 250 bilhões para recuperar sua infraestrutura básica.

A suspensão parcial das sanções abriu caminho para investimentos estrangeiros em energia, saneamento, telecomunicações e obras públicas. Estados Unidos e União Europeia emitiram licenças especiais que permitem projetos humanitários e de reconstrução.

Para Damasco, essa abertura representa uma tábua de salvação. A economia síria foi reduzida a uma fração do que era antes da guerra e o país depende agora do apoio internacional para se reerguer.

A expectativa do governo interino é que, em até um ano, parte dos serviços essenciais — como energia e saúde — sejam parcialmente restabelecidos.

Mas, ao lado das oportunidades, surgem tensões. Muitos dos grupos que compõem a base armada do novo governo ainda defendem uma visão fundamentalista do Islã.

Episódios recentes de violência sectária contra alauítas — minoria à qual Assad pertencia — deixaram mais de 1.700 mortos e expam a fragilidade do controle central de Sharaa. Ele prometeu punir os responsáveis, mas enfrenta dificuldade para conter milícias independentes.

A presença da sharia na constituição provisória também acendeu alertas. Embora Sharaa evite detalhar o grau de islamização do futuro Estado, o temor de que a nova Síria se torne um regime teocrático não é pequeno, principalmente entre minorias religiosas e setores laicos. Até o momento, a retórica pública do presidente interino tem sido moderada, buscando distinguir seu governo do extremismo jihadista internacional.

No plano regional, o caso mais sensível é a relação com Israel. Nas últimas semanas, dois foguetes foram lançados do território sírio em direção às Colinas de Golã, controladas por Israel. Um grupo extremista reivindicou a autoria, afirmando que a revolução síria se desviou ao negociar com o Ocidente. A reação israelense foi imediata: bombardeios aéreos atingiram posições no sul da Síria.

Damasco negou envolvimento no ataque e reiterou que não representa ameaça aos vizinhos. O episódio, no entanto, demonstrou como elementos fora do controle do governo central podem minar os esforços de reconciliação.

Israel, por sua vez, permanece dividido: há quem defenda diálogo com Sharaa, e outros que o veem como “um jihadista de terno”, incapaz de garantir segurança.

Apesar disso, há indícios de que contatos indiretos entre os dois países estejam ocorrendo, com mediação de potências ocidentais. Thomas Barrack, o enviado americano, sugeriu que um acordo de não-agressão poderia ser o primeiro o para a paz. Donald Trump também teria incentivado essa aproximação, ainda que discretamente.

A situação segue instável. Qualquer novo ataque, seja de facções radicais sírias ou de resposta israelense, pode desencadear uma espiral de violência. Ao mesmo tempo, a dependência econômica de Sharaa em relação ao apoio ocidental o obriga a manter o discurso moderado e evitar conflitos regionais.

Em meio a tantas contradições, a Síria tenta se reconstruir e redefinir seu papel no cenário internacional por meio de inserção na agenda ocidental. A derrocada de Assad abriu espaço para uma nova ordem, com raízes jihadistas, e os caminhos são incertos.

O governo de Ahmed al-Sharaa parece representar uma incógnita: ao mesmo tempo que é acolhido pelo Ocidente, carrega um ado de guerra santa e conexões com o extremismo.

Se conseguirá pacificar o país, equilibrar interesses internos e externos, consolidar a reconstrução e evitar novas guerras — ainda não se sabe. Mas o que já é certo é que, desde a queda de Assad, o Oriente Médio entrou em uma nova fase. E a Síria, mais uma vez, está no centro do palco.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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